Artigo: Uma Relação entre Ética e Psicanálise


Autor: Ademilson Marques de Oliveira



Resumo: Pretende-se fazer discutir e refletir sobre variados ideias filosóficas, da antiguidade a contemporaneidade. Para este estudo buscaremos fazer uma relação entre as éticas: filosófica e psicanalítica. Disponibilizaremos exemplos para ilustrar os conceitos, bem como faremos comentários, visando possibilitar a melhor compreensão possível ao leitor. Conclui-se que, á ética da psicanálise, busca colaborar nas relações entre analistas e analisados, mecanismos que possibilitam aos sujeitos, condições de relacionarem melhor consigo mesmo, com a natureza e com o mundo. Por outro lado, a ética filosófica, visa nortear os sujeitos, rumo a um “padrão social desejado”, em relação à cultura que está inserido, em razão de um bem comum.

Palavras chaves: Ética; Filosofia; Psicanálise; Análise.

Introdução:

A partir de uma análise reflexiva das concepções éticas, dialogando com diversos períodos históricos, da antiguidade a contemporaneidade, propõe-se a desenvolver uma pesquisa, onde buscaremos fazer uma relação entre Psicanálise e Ética.

A metodologia utilizada para este trabalho é a documental, onde foi realizado um levantamento bibliográfico de referências pertinente ao tema.

Trabalhemos com fontes secundarias como: sites, revistas, teses e dissertações. Para realização do trabalho foi feito fichamento de diversos textos. Finalmente foi construído o ensaio.

O nosso objetivo é provocar perturbação ao leitor, visando facilitar a emancipação do pensamento. Para isso, faremos algumas provocações: Existe verdade, verdadeira, do ponto de vista racional e filosófico? É possível questionar as verdades éticas? E para a ética na psicanálise, existe um modelo ideal, um exemplo a ser seguido? Há diferença entre a ética filosófica da psicanalítica? Qual a finalidade da psicanálise?

Discussão/Reflexão:

Alguns estudiosos entendem que a Psicanálise é bem mais que uma teoria de conceitos, ela é uma experiência onde é proposto um novo saber, diferente, e talvez, contra a tradição da ciência e da metafísica.

É importante ter em mente, que falar de ética é sempre muito prazeroso, pois é um tema que sempre inquietou o homem. Assim, na busca do prazer, provoca-se as seguintes indagações: Quais os pressupostos da ética filosófica em relação à ética psicanalítica?

Em referencia às questões éticas, a estudiosa, Cláudia Maria Bonifácio (2009), dessa forma responde:

A questão ética surge, portanto, no momento em que é feito um apelo a iniciativa do homem, pressuposto que sua ação não é condicionada pelo curso natural das coisas. Importa, pois, determinarmos o lugar da ética na atividade do homem. A dimensão ética da ação inscreve-se na temporalidade própria do existir: capacidade de iniciativa para forjar, por si mesmo, seu ser futuro: poder de agir, decisão fundada na deliberação.

A exigência ética implicada na ação é, precisamente, a determinação da vontade na realização daquilo que a existência contém em si enquanto ainda não realizado.

Segundo a historiografia, Sócrates deu um grande exemplo de ser ético, ao ser preso, acusado de corromper os jovens, teve oportunidade de fugir, mas não quis, pois, acreditava que esta ação infligiria sua consciência. 

Também, nesta esteira temos que considerar a ideia platônica, pois, Platão, através da reflexão sobre o mundo ideal em relação ao mundo real, ele apresenta uma proposta ética. Cláudia Maria Bonifácio (2009), fala o seguinte:

Platão foi o primeiro a enfrentar filosoficamente, isto é, compor um rigor de método e profundidade de reflexão, a questão do bem. A interrogação platônica visará a questão do “bem em si mesmo” e de como este “bem” se apresenta com bem-para-nós, ou seja, como bem na vida humana.

 Portanto, a ideia de bem, neste caso, é composta de três propriedades constitutivas: a proporção ou medida, a beleza e a verdade.

Já em Aristóteles, bem resumido, baseado na ética das virtudes, entende-se que as virtudes éticas do homem resultam no hábito: o que é próprio do homem é que ele é capaz de estabelecer fins que visem à justiça e, pelo exercício, de atualizar esse bem. Aristóteles é fundador da ética filosófica. Todo o esforço da ética enquanto disciplina autônoma será, a partir de Aristóteles, o de pensar, ante essa fragilidade e instabilidade que são inerentes ao ser-aí do homem, possibilidades de existência que possam pretender a uma certa constância, e, nesse sentido, pensar as práticas que merecem ser habituais, sem que se abandone, no entanto, as exigências de concretude que condicionam a vida prática do homem.

Por outro lado, na modernidade, Kant representa uma ruptura em relação a concepção prevalente do mundo antigo e medieval. A ética aristotélica apresentada como meio da felicidade (eudaimônica) e da finalidade (teleológica), onde a noção da natureza humana é determinante para atingir a excelência. Kant recusa a procura da felicidade ou qualquer outro bem como finalidade da ação humana. Sua crítica à possibilidade de conhecermos a essência (número) do mundo e das coisas determina a produção de uma ética do dever da ação humana.

Depois tivemos Hegel, foi ele que concebeu um dos sistemas éticos mais profundos da modernidade, reformulou a noção aristotélica e articulou-as aos problemas sociais e políticos que a modernidade havia posto.

Não se pode esquecer-se de Gadamer, este faz uma crítica ao formalismo kantiano, ele diz: postular a existência de valores a priori, retrocede a reflexão ética, a um tipo de rigor utópico.

Ainda, Gadamer entende que o saber prático, é um tipo de reflexão que pode iluminar sua intervenção em algum contexto. Este saber, não é, por sua vez, uma técnica, mas um saber moral.

Por outro lado, Hegel, ao tratar da substância ética, entende que o Estado tem seu direito, mas não é uma existência abstrata e sim concreta; somente esta existência concreta, e não dos múltiplos pensamentos universais que se tem por preceitos morais, pode ser princípio de sua ação e de sua conduta. Como, muitas das vezes, o assunto sobre a moralidade, à natureza do Estado e a relação com o ponto de vista moral é tratado com superficialidade, acaba tendo uma impressão errada sobre a política, sempre achando que ela se opõe à moral. 

Observando os pensamentos de Hegel sobre a consciência substancial, ele não nega propriamente o ponto de vista moral, mas apenas não concede a este a determinação do que seja o bem comum. Como bem exprimiu Robert “Hegel afirmou que o que é um bem para os homens há de estar em relação com os outros, dentro de certas instituições”. 

Substância ética é construída a partir da atividade prática daqueles que pertencem à comunidade política, e tem o dever reconhecer a liberdade e a racionalidade de cada indivíduo, ou seja, a forma de agir de cada um para manter o bem comum. Seguindo a linha hegeliano, o simples pertencer uma comunidade política não basta para assegurar a vida ética desta comunidade, apenas com a racionalidade das instituições que será requerida a justificação ética de uma sociedade. 

Em outras palavras, a razão da existência da ética que constrói uma base sólida nas instituições, do mesmo modo que ela está inserida nas reivindicações normativas que fazem o equilíbrio da relação entre direitos e deveres do poder político de um Estado. 

Para Hegel não basta que os indivíduos cumpram seu papel civil dentro dos princípios das leis, para que as exigências da racionalidade que caracterizam a vida social e política moderna sejam satisfeitas. Todo sujeito que pertence a uma comunidade política, a um Estado, age de forma livre para com suas ações, claro que a consciência de direitos e deveres interfere no seu modo de agir. Ele ainda acredita ter uma vida baseada na ética, seja na atmosfera social como política, tudo deve ser fundamentado na ideia de liberdade, e que à tradição, o sentimento cívico ou os princípios religiosos não intervêm nas ações dos indivíduos. 

Entretanto, na mesma linha de Kant, Hegel afirma que essas liberdades que todos possuem para traçar suas ações devem estar dentro da lei. Se não for assim, não será válido eticamente falando, o sujeito deve ser autoconsciente da lei e que deve se submeter, consciente do fato de que esta validade é sempre coletivamente posta e historicamente instituída.

A visada ética, defendida por Ricouer, é, em sua amplitude, a "visada da vida boa" como e pelos os outros em instituições justas. O primado da ética sobre a moral, segundo a análise de Ricouer, significa propriamente uma preponderância da visada, que compreende o aspecto reflexivo do agente ao visar o bem, o aspecto teleológico da ação, sobre a norma, a qual se liga à perspectiva deontológica.

A moral refere-se à relação do agente face à lei moral, a qual exige desde uma ação que não flutue ao sabor de suas preferências ou inclinações pessoais, mas uma ação determinada pelo respeito ao dever, ao que deve ser feito.

A ética implica, por sua vez, a capacidade do sujeito da ação de engajar uma visada, ou seja, de pretender a um fim bom. Assim pode-se dizer que a ética não é o contrário da moral. O contrário da moral é o imoral.

Ricouer sublinha, no entanto, que a dimensão da universalidade não basta para caracterizar a moralidade kantiana.

É importante perceber que a unidade constituída pela  visada ética e o campo das relações sociais é que irão tecer o horizonte da vida boa, que não é obra solitária de indivíduos isolados. Ela implica, evidentemente, a ligação do indivíduo a tradição, isto é, ao conjunto dos valores e normas coletivamente sancionadas e cristalizadas nas instituições, ou seja, a um Etchos.

Gadamer relaciona a ética à historicidade através da determinação política e social do sujeito, isto é, seu enraizamento num contexto social e político determinado, não apenas o formou tal qual ele é, mas é este quem lhe fornece o conteúdo mesmo de sua ação e é aí que ela será reconhecida como ação ética.

Porém, no caso da ética na psicanálise deve se ater em si mesmo, não no outro.  Ela está ligada a nossa história pessoal. O sujeito precisa de se autoconhecer e se compreender para guiar o seu agir no mundo. Aqui, percebe-se às ideias socráticas: “conheça-te a ti mesmo”.

Diante de várias reflexões acerca da ética filosófica, nota-se que ela está ligada à virtude, à prudência, ao dever, à felicidade e à justiça.

Por outro lado, a ética na Psicanálise, baseado nas orientações de Freud, está de certa forma conectada ao inconsciente, onde o sujeito tem certos comportamentos, sem que o próprio o perceba.

Em alguns casos, estes comportamentos são aéticos, que talvez, possa ser considerados desvio de caráter. São bastantes presentes nos atos falhos. Ás vezes nos lapsos de memória, ou até mesmo, no ato de falar sem querer, o inconsciente acaba por trair o consciente.

Neste caso, o analista tem um modelo, ou técnica, ou um método para tratar o sujeito-paciente? Não tem! Considerando que, á ética na psicanálise está voltada para a experiência da análise, e não para prescrições. Portanto, não há determinação de estilo, de ideal, de exemplos a ser seguido, de certezas de que aquilo que o sujeito estiver fazendo é coisa certa a se fazer.

Copjec, 2006, p.23, afirma que: "a Ética da Psicanálise diz respeito à relação do sujeito com suas zonas erógenas, com suas pequenas partes do ser”. Na mesma obra, na pág. 74, ele escreve: 

"a ética da psicanálise não se preocupa com o outro - como é o caso de numerosos trabalhos contemporâneos de ética - senão com o sujeito que se metamorfosea no momento em que se encontra com o real de acontecimento inesperado”. 

Portanto, para Peres, a ética da psicanálise adere o argumento de Kant, segundo o qual o progresso ético não tem nada a ver com a forma do progresso que promove a indústria moderna, ou o serviço do bem, se não que se trata de um assunto de transformação pessoal, da necessidade subjetiva de ir para além de si mesmo.

Desta forma, o professor, Daniel Omar Peres (2017), fala que:

a psicanálise se ocupa com a experiência ética onde as condutas humanas seriam determinadas pela relação do sujeito com os seus próprios desejos, onde esses desejos seriam da ordem do irrepresentável e mobilizariam o sujeito permanentemente”.


Considerações Finais:

Assim, entendemos que á ética da psicanálise, busca colaborar nas relações entre analistas e analisados, mecanismos que possibilitam condições de relacionarem melhor consigo mesmo, com a natureza e com o mundo. 

 Já em relação à Filosofia há variados tipos de éticas. Portanto, sua aplicação é importante, no sentido de nortear os sujeitos, rumo a um padrão social desejado, em relação à cultura que está inserido. Isso é visível nos diversos códigos de ética, referente aos conselhos de classes, por exemplo: Conselho de Medicina, de Fisioterapia, de Engenharias, de Advogados, de Psicologia, de Farmácia, de Enfermagem, além de outras organizações políticas e sociais.

Por outro lado, a ética na psicanálise está voltada para a experiência da análise, e não para prescrições. Portanto, não há determinação de estilo, de ideal, de exemplos a ser seguido, de certezas de que aquilo que o sujeito estiver fazendo é coisa certa a se fazer.

Referencias Bibliográficas:

ARISTÓTELES. Ética a Nicômacos, 3. Ed. Tradução do grego, introdução e notas de Mario gama Kury. Brasília: UnB, 1992.

Perez, Daniel Omar. Ética da psicanálise. Vitória: Universidade Federal do Espírito Santo, Secretaria de Ensino a Distância, 2017.

UNIVERSIDADE CATÓLICA DE BRASÍLIA. Apostila de Ética. Licenciatura em Filosofia. Brasília: EAD, 2007.

UFES. Curso Especialização em Filosofia e Psicanálise. 2017, Vitória. Disponível em: <http://www.especializacao.aperfeicoamento.ufes.br/course/view.php?id=296>. Acesso em: 24 de março de 2018.


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